5/30/05

O comprador de livros.

Quanto mais seus dias passavam mais lhe crescia o fascínio pelo mundo das palavras. Uma porta que se abrisse era suficiente para voltar o pensamento às páginas brancas ou amarelas ou de qualquer cor do mundo, contanto que escritas, cheias e entupidas pelas detentoras de tudo na vida dele. Seria um absurdo a ausência das letras entrelaçadas, coaguladas em despropósito, irritantemente transparentes na vastidão dos significados que ele dava a cada uma. Gostava tanto tanto tanto das letras porque eram o desmembramento das palavras, mas gostava tanto tanto que talvez a primeira palavra que lhe saltou da boca na primeira infância foi a palavra ‘palavra’. Sua paixão ganhou forma e encadernação. Livro. Quanto mais comprava mais comprava. Não comprava pela cor ou cheiro, nem mesmo pela maciez do toque ou espessura, muito menos pela beleza que aquele espanto lhe causava nos olhos toda vez que observava em contemplação mórbida a estante repleta deles, em todas as formas e tamanhos, comprava pelas palavras, todas elas ali juntas em diversão de espírito que faziam dele, orgulhosamente, um comprador de livros. Comprou tantos que se fez um. Virou livro, capa e contracapa, adorno de sonho, reversão do desenho na vermelhidão, palavra e palavra e palavra. Palavra interminável e imortal, sem fim, alucinação. O zelo reluzia uma a uma, escolhidas a dedo para encher as páginas. Imagina-se, até aqui, como seriam os beijos de um comprador de livros. Sim. Beijo. Talvez tenha sido essa a palavra que ele menos escreveu, ele o fez.

5/23/05

"Chegando assim, mil dias antes de te conhecer..."

Sábado, no final do mês, pode ser tão ruim quanto um segunda-feira.
Nada pra fazer e a falta de grana imperante, absoluta, sorrindo da desgraça alheia.
Depois de uma massagem na cabeleira, um banho de lua (daqueles que a gente mesmo faz em casa), manicure... celular toca, quietinho, quase silencioso! SUSTO! Era o meu amor gritando que acabava de chegar!
A coisa melhor da vida é perceber que em questão de segundos o mundo pode dar um salto de qualidade...
Meia hora depois, de blusa verde, cheirinho de avião, cabelo bem cortadinho - do jeito que eu mais gosto - sorriso transparente e olhos de desejo!
O restante dessa história eu só não conto pra vocês porque, para sabê-lo, bastam duas palavras: saudade e amor!

5/20/05

Ainda que eu falasse.

Estou com vontade de fazer análise, vontade de alguém que escute detalhadamente as minhas idéias mais íntimas, as mais absurdas e as mais comuns, alguém que me olhe com leitura, que me desbrave e que me deixe à vontade pra falar e falar e falar. Alguém que depois me fale, que diga tudo, que pincele a minha alma com tinta de todas as cores, principalmente de amarelo... por que será que eu gosto tanto de amarelo? Isso também nós teremos que descobrir! Mas tenho a estranha sensação de que ainda que eu falasse e falasse e falasse eu não diria tudo, teria sempre alguma coisa lá dentro do caixote escuro, lá no fundo, que eu não arrancaria... será? É, acho que vou fazer análise. Quem tem necessidade de palavras em qualquer espaçozinho vazio tem também necessidade de respostas para os próprios questionamentos. Meus Deus!

5/19/05

Amor Espilicute:

foi quando eu finalmente defini:
amor espilicute é amor saltitante, feliz, amor cheio de estrelas, amor com um milhão de beijos, com gosto de morango e cheiro de hortelã, amor com trancinhas e laçarote vermelho no cabelo, amor retribuido, sem ter preço nem tamanho, amor sem igual, único e inquieto, seguro e barulhento, silencioso e explosivo, amor cá dentro, atrevido e brega, sofisticado, sedutor. É amor diferente, que brilha e lubrifica, ardente, amor desajeitado e experiente, amor safado, com adrenalina. Amor espilicute é amor espilicute... como o meu!

5/13/05

Ardor...

Tinha uma pimenta em minha mesa. Vermelha.
Ela olhava pra mim, sem querer me dizer nada.
Ela usava toca colorida de amarelo e verde, o que lhe fazia ficar parecendo um indiozinho alegrete.
Mas eu estava triste. Triste demais.
Nada de vermelho.
Nada de ardor.
Só uma chuva forte caindo, lá fora e aqui, dentro de mim.

5/11/05

O que é isso?

Meu post de hoje será curto e pouco poético, vai para pessoas, pessoas que chegam na hora errada e mesmo assim ficam, pessoas que alisam, chegam de mansinho, caladas e quando a gente vê tomaram de conta do nosso chãos, das nossas rédeas, pessoas que nos dão passaportes de agrados refinados, que não usam roupas sofisticadas mas que fazem de nossas vidas festas de gala, que apostam na força do momento, que arriscam sonhos mais profundos, permanecem, pessoas que são tendências, que pulam na aurora, que fazem revoada como pássaros. Para essas pessoas vai o meu post de hoje. É que mais um dia eu acordei assim...

5/9/05

De olhos fechados.

Acordei hoje com vontade enorme de dormir mais, dormir o dia inteiro, dormir quem sabe uma semana.
- Cala a boca, despertador desgraçado, me deixa fazer de conta que ainda é cedo!?
- Coragem!
Água gelada no corpo e no cabelo, roupa limpa, café forte e sem açúcar.
Minha filha nem me deu o mesmo trabalho pra acordar, levantou-se com sede, de água e brincadeira... banho morno e nescau com açúcar.
Nas ruas, a mesma agonia do início das semanas, a mesma tormenta, o mesmo caos.
Decidi fazer todo o trajeto de olhos fechados, imaginando um tempo de 23º, tudo bem fresquinho, primavera, flores coloridas pra todo lado...
Ainda de olhos fechados percebi que o lugar imaginado existe, tem nome e sobrenome. A preguiça, a agonia, a tormenta, o caos, estão cá dentro, explosivos. A primavera chega dia 22... preciso saber a hora do vôo!!!

5/6/05

Uma palavra portuguesa...

Hoje acordei assim...
percebendo no tempo o arrastar das folhas. Uma poeira densa cobrindo a estrada e o meu corpo, imóvel, ao mesmo tempo. Vazio infinito tomando conta dos meus medos como se eles fossem criança e nenhum consolo para afagar minha alma, inquieta, que brinca de ficar parada na ausência do amor que viaja.
No pouco espaço que antecede as horas reluto fazer uso de palavras tristes, observo as comissárias de bordo com seus falsos sorrisos e suas falsas vozes e suas falsas peles, a agonia das pessoas ao redor que paralisa meus desejos mais secretos, as luzes que alteram a cor dos olhos. Continuo sem fazer uso de palavras tristes... serão apenas sentidas; entre elas a mais estúpida de todas, a mais dolorosa, aquela palavra que não cabe no mundo porque ele a desconhece, nas mais vastas traduções. Um oceano cheio dela, da palavra, a mais bonita, a mais triste. Saudade.

5/5/05

Preguiça de início.

Tenho mania de intimidade. Abro geladeiras de desconhecidos e bebo leite, não água. Não gosto da timidez dos inícios. Amo a liberdade dos dias que se atropelam, que acostumam. Adoro a sem-vergonhice e o despudor. O mundo é pulsante demais para a maciês dos princípios. Ovos quebrados. Casulos. Ostras. Entro pela porta de trás. Caio em tentação nos abismos mais ilimitados. Navego pelas entrelinhas da indecência. Sou tubarão-martelo, não tenho culpa. Meus paralelos são perpendiculares e, na encruzilhada, visto a roupa da noite. Amo demais. Minha alma é de carne e osso.

"Abençoados os que esquecem, porque aproveitam até mesmo seus equivocos"- Nietzsche